Obrigado!

O Brasil é decisivo para o cumprimento do Acordo Global de Metano, dizem especialistas

Sozinho, o país é responsável por 5% de todo o metano emitido no mundo – 75% dessas emissões são oriundas da agropecuária brasileira. Os dados foram divulgados nesta quarta-feira (9/11), em evento realizado no Brazil Climate Hub.

Por Daniela Vianna, ClimaInfo

O Brasil tem um papel protagonista para o sucesso do Acordo Global do Metano, que foi assinado durante a Conferência do Clima de Glasgow, na Escócia, no ano passado e prevê a redução em 30% das emissões desse gás de efeito estufa em todo o mundo até o final desta década. Segundo Marina Piatto, do IMAFLORA, as técnicas para redução das emissões da agropecuária no Brasil já existem, mas o desafio do Agro é adotá-las, pois o custo é elevado. É necessário um plano de investimentos para a transição descarbonizada.

Os dados integram o inventário de emissões do SEEG Brasil (Sistema de Estimativas de Gases de Efeito Estufa), que foi apresentado hoje no evento “A década perdida das emissões brasileiras: o que revelam 10 anos de estimativas anuais feitas pela sociedade civil’, realizado nesta quarta-feira, 9 de novembro, no Brazil Climate Action Hub – espaço da sociedade brasileira na Conferência do Clima do Egito (COP27).

Tasso Azevedo, coordenador do SEEG, lembrou que o Brasil – quinto país maior emissor dos Gases de Efeito Estufa (GEE) do mundo, atrás de China, Estados Unidos, Índia e Rússia – atingiu 2,4 gigatoneladas de carbono equivalente em 2021. Descontadas as remoções (cálculo de atividades de captura de carbono no solo), são 1,8 bilhões de toneladas de CO2 equivalente. Metade das emissões brasileiras ocorrem devido a mudanças no uso da terra, sendo que o desmatamento é responsável por 95% dessas emissões. Diferentemente dos maiores emissores globais, países onde três quartos das emissões ocorrem devido à queima de combustíveis fósseis, no Brasil são a mudança no uso da terra e a pecuária que lideram esse percentual. Somadas, elas respondem por 75%, ou três quartos, das emissões de GEE brasileiras. Houve um aumento de 12% nas emissões do país em 2021, na comparação com 2020. “É muita coisa”, disse Tasso Azevedo. Esse aumento aconteceu em praticamente todos os setores, exceto em residuos, que teve, pela primeira vez desde o início das medições, há 10 anos, um decréscimo.

Do ponto de vista de emissões per capita, o Brasil contribui para piorar a média global, que hoje está em 6,7 toneladas por habitante. No caso brasileiro, em 2021, a média de emissões de GEE é de 11 toneladas por habitante (ou oito, descontadas as remoções), semelhante às emissões da China (atualmente em 9 ton/hab) e equivalente à metade dos EUA e o dobro das emissões per capita da Índia.

Na distribuição pelos setores da economia, a agropecuária responde por ¾ das emissões  brasileiras, seguida pelos segmentos de transportes, indústria e geração de energia. Entre os estados, o que mais emite gases de efeito estufa é o Pará, devido às mudanças do uso da terra, seguido por Mato Grosso e Minas Gerais. Entretanto, quando se retira a parte de mudanças de uso da terra dos cálculos, São Paulo passa a ser o estado que mais emite, sendo energia, transportes e hidrelétricas os segmentos mais carbono-intensivos.

Tasso Azevedo exaltou a diversidade do país em termos de emissões. “Quando se olha para os estados, analisando do ponto de vista de emissões per capita, as emissões de Roraima – 90 toneladas por habitante – são maiores do que as emissões do Catar, maior emissor per capita do mundo. Já o Rio Grande do Norte tem emissões compatíveis às Pequenas Ilhas, na faixa de 1 a 2 ton/hab”, explicou Azevedo.

Distanciamento do Acordo de Paris

Azevedo ressaltou que o Brasil está se distanciando, em vez de se aproximar do cumprimento das metas estabelecidas no Acordo de Paris, em 2015. Segundo ele, o compromisso da Política Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC), de se reduzir entre 36 e 39% as emissões de GEE em relação a 2010, estão mais ditantes. “Em 2020, ficamos na marca, mas, em 2021, quando se olha para a métrica, as emissões foram bem maiores do que a meta (prevista) de 2020”, ressaltou. De acordo com Azevedo, desde que foi implantada a PNMC, em 2010, as emissões, em vez de reduzir, aumentaram 43% no período, especialmente por conta do desmatamento.

O compromisso do Acordo de Paris, de reduzir 37% das emissões liquidas em 2025, na comparação com 2005, e em 50% até 2030, em relação a 2005, daria uma meta máxima de 1,6 gigatoneladas de emissões, em 2025, e de 1,2 gigatoneladas, em 2030. Elas estavam em 2,4 gigatoneladas, em 2005, em 2015, estavam em 1,4 gigatoneladas. Atualmente, estão em 1,7 gigatoneladas. “Neste momento, o Brasil está se distanciando da meta. O Brasil precisa fazer esforço importante agora para chegar em 2030 cumprindo a meta. Ainda é possível chegar, e a chave para atingir a meta depende das nossas ações para reduzir o desmatamento e aplicar técnicas de agricultura de baixo carbono”, afirmou.

O impacto da agropecuária

Marina Piatto falou sobre o setor de agropecuária, que está à frente das emissões brasileiras. Ela lembrou que o Brasil tem o maior rebanho comercial do mundo, com mais gado do que a população brasileira. O gado, por ser ruminante e ter fermentação entérica, emite muito gás metano. O Brasil vem aumentando o seu rebanho desde a década de 1970. Mesmo diante de outras fontes de emissões da agropecuária, como solos manejados, cultura do arroz irrigado e queima de cana, o maior desafio continua sendo o setor de produção de gado de corte e leite bovino do Brasil. Ela ressaltou, entretanto, que existe um esforço brasileiro em direção à agricultura de baixo carbono, porém, por metodologias internacionais aceitas atualmente, não é possível refletir esse esforço nos cálculos das emissões brasileiras.

Mudanças de uso e cobertura do solo

Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), falou sobre as mudanças de uso e cobertura do solo. Segundo ela, quando se olha para os biomas, o desmatamento tem papel preponderante nas emissões de gases de efeito estufa brasileiras. A Amazônia responde por 77% das emissões do país, sendo que 91% das emissões do bioma amazônico estão diretamente relacionadas às mudanças de floresta para a agropecuária. “Combater o desmatamento é a solução mais barata e eficiente de reduzir as emissões brasileiras de GEE”, afirmou, ressaltando que a Mata Atlântica também teve muitas emissões por queima de áreas de vegetação secundária. 

Segundo Ane, “a remoção por áreas protegidas esconde a situação das emissões”. Como exemplo, ela citou o Amazonas, que aparece com emissões líquidas negativas, embora seja uma das principais frentes de expansão do desmatamento, com ocupação de terras públicas e grilagem de terras. Os incêndios florestais, segundo ela têm altos impactos nas emissões em vegetação nativa no Brasil: “uma vez a Amazônia recebendo impacto dos incêndios florestais, ela pode perder 25% do estoque de carbono, isso é muito relevante”, destacou. Ane alerta que os incêndios florestais ainda não são considerados pelas metodologias internacionais porque ocorrem de forma natural em alguns países – não é o caso do Brasil, onde as queimadas por desmatamento são preponderantes. Para que os dados sejam registrados e incorporados em análises futuras, o SEEG faz as medições da mesma forma, e as apresenta de forma separada na plataforma.

Emissões de Energia, Transportes e Resíduos

Por fim, David Tsai, do Instituto Energia e Meio Ambiente, falou remotamente sobre os setores de energia (por queima de combustíveis fósseis e por emissões fugitivas de escapes de produção de petróleo e gás e extração de carvão mineral), processos industriais (transformações físico-químicas de materiais na indústria primária, como produção de cimento e de aço) e de resíduos. A crise hídrica – com o acionamento maior de termelétricas –, associada ao aumento de consumo por energia, impactou diretamente no aumento das emissões de GEE no Brasil em 2021 na comparação com anos anteriores. O destaque ficou para o setor de resíduos – que abarca a disposição final dos resíduos sólidos e o tratamento de efluentes – registrou uma leve queda, mostrando o progresso da Política Nacional de Resíduos Sólidos, principalmente pelo tratamento do metano emitido em 51 aterros sanitários, muitos deles localizados no estado de São Paulo.

Todos os eventos foram gravados e estão disponíveis em português e ingles no website do Brazil Climate Hub.

#brazilclimateactionhub #cop27 #climaesociedade

Crédito da foto: Eduardo Carvalho/Brazil Climate Hub

Compartilhe:

Outras notícias